sábado, 25 de julho de 2015

A carta de uma filha


Somos tão minúsculos nessa imensidão de mundo.
Entendemos o tamanho do mundo quando envelhecemos. Somos frágeis, indefesos e pequeninos, então aqueles olhos grandes e brilhosos te encaram como uma esfera reluzente.
Você não entende direito o que tudo aquilo significa, mas é tão quentinho. Todo o desespero do frio congelante que bateu na espinha parece se dissipar. Estou no colo de uma mãe, da minha mãe.
Crescemos, brigamos, nos abraçamos e sempre naquelas datas especiais – natal, aniversario, dia das mães, choramos feito crianças. Crescemos e nos achamos grandes e independentes. Gritamos com elas quando tentam nos impedir de fazer algo que queremos muito. Usamos a frase: “Eu já sei me virar”. É claro que eu não sei me virar, e hoje eu sei disso.
Acho que com tudo isso, toda a história que foi escrita cuidadosamente num papel de pão, nós não contávamos com a morte. Nunca contamos com ela. Ela é do tipo convidado indesejado. Aquele que a gente nunca espera, e quando menos esperamos, ele aparece. A morte é um carteiro que traz o telegrama no momento de guerra, entregando a má notícia. A nossa primeira vontade é de gritar muito alto para que todos possam olhar e sentir minha dor rugir através da garganta, que dói, que arde e queima. Então, eu aprendi a sentir algo mais forte que o amor, é a dor de perder um amor, o maior amor que Deus no deu, a mãe. Não estou falando de qualquer mãe. É a melhor mãe. Porque a nossa sempre é a melhor, não é? Pelo menos, na maioria dos casos, sim. Perder aquela mulher que me aguentou a vida inteira. Aguentou meus momentos terríveis e também meus momentos incríveis. Aquela mulher que me gerou, me deu o que comer, o que vestir, me ensinou tudo o que eu sei. Essa dor eu jamais poderia descrever.
Cada “sinto muito” é uma ardência no peito. Não queremos ouvir ninguém. Só queremos a mãe de volta. Um abraço, um sorriso, um beijo de boa noite, qualquer coisa tá valendo. Porque tudo parece vazio e cada dor que ressurge no peito é aguda e infinita. A sensação é de que não pude dizer adeus... e não pude. Mas por que Deus? Por que você não me deixou dizer adeus? Então ele me falou.
“Filha, ainda que esteja ‘descalça’ e ‘destruída’, essa mulher que você diz que perdeu, agora está comigo, vestindo um lindo vestido florido esvoaçante, e seu sorriso é mais branco do que as nuvens do céu. Me deixe entrar no seu coração para que você tenha a certeza de que isso não é o fim. Sua mãe não quis dizer adeus a ti, porque sabia que seu coração, embora forte e guerreiro, não aguentaria. Eu criei vocês mulheres com dons, dons de serem mães e conhecerem suas crias como ninguém. Sua mãe está bem minha filha, muito bem por sinal. Foi recebido pelos seus entes amados e agora ela está em seu processo de restauração. Minha filha, tenha paciência, você a verá de novo, eu lhe asseguro. Enquanto isso, guarde-me em teu peito que lhe trarei paz, sou eu... seu pai... seu tempo... e sua consolação. ”
Recebi uma carta de Deus, e nela dizia que minha mãe está bem. Ainda assim, sinto meu coração aflito e despedaçado, mas uma leve sensação me corta os soluços que interrompiam minha respiração. Meu coração foi ganhando uma certa tranquilidade e meus olhos pesaram. O sono bateu e não contive o cansaço que me fez cair na cama como um tijolo caindo de um prédio de 20 andares. Então, eu a vi. Caminhando com o vestido que Deus descreveu. Nossa! Como ela estava linda. Ao lado dela, eu via homens e mulheres sorrindo e gargalhando sobre algo que eu não conseguia ouvir. Ela parou perto de uma árvore e me observou de lá. Eu queria correr e abraça-la, mas sentia meus pés presos no chão. Então ela sorriu. Pude ver o sol bater em partes dos seus cabelos negros. Ela parecia muito mais jovem. Ainda me olhando, ela sussurrou as seguintes palavras: “Me perdoe por não conseguir me despedir. Eu não consegui. Eu vou te amar por toda a eternidade. Não chore. Vou estar sempre contigo. Sempre. ”
Meus olhos ardiam de maneira que mal conseguia mantê-los abertos, pois as lágrimas embaçavam minha vista. Passei minhas mãos pelos olhos e acordei. Acordei? O coração disparado. O cansaço ainda estava ali e então adormeci novamente. Dessa vez não sonhei. Quando acordei, senti o coração um pouco mais leve. Eu sabia que ela estava ali e sempre que eu precisasse dela, era lá que iria encontra-la, em meus sonhos.
O que posso dizer é que nada nessa vida, nenhuma ciência, nenhuma religião ou teoria, pode explicar o amor de uma mãe por um filho e a dor do filho em perder sua mãe.


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